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Para enxergar a cortina entre ficção e realidade

  • Foto do escritor: cienciaeculturagp
    cienciaeculturagp
  • 30 de out. de 2019
  • 3 min de leitura

Iniciando o texto retratando as polêmicas discussões empreendidas pelas mais diversas figuras brasileiras, no período da eleição presidencial de 2018, no Brasil, destacando que é “difícil escapar à sensação de que realidade e ficção, verdade e falsidade estão perigosamente invertidos”. Leonardo Crochik argumenta que pensar mais ampla e dinamicamente as relações entre ficção e realidade da atividade científica não implica em dizer que não há distinções entre os tipos de ficções. No capítulo "Ficção criadora do real" (capítulo doze do livro Física, cultura e ensino de ciências), o autor assume pelo menos dois tipos de ficções, ao analisar o contexto das ocupações estudantis das escolas nos anos de 2015 e 2016.


Para compreender a análise feita por Leonardo, é preciso entender sua acepção de ficção. Ele entende esse conceito pelo seu viés positivo: que diz respeito ao seu potencial de criação, tanto simbólica quanto material. Dessa forma, essas ficções tem um papel na constituição das verdades científicas: logo no início do fazer da ciência há a formulação de hipóteses, que conta com uma atividade forte da criatividade, reconhecendo o caráter especulativo da ciência, com exemplos na física como as antipartículas, matéria e energia escuras. Entretanto, há certo incômodo com essa liberdade criativa da ciência e como exemplo, o autor traz a crítica de Francis Bacon (do século XVI) e seu desgosto pela especulação copernicana, criticando a introdução de ficções na natureza para os cálculos darem certo. Nesse ponto, Leonardo defende o poder transformador da realidade de ficções: a introdução de uma ficção em um momento histórico parece inconcebível, e em outro momento é naturalizado, como o exemplo do heliocentrismo. Assim, Crochik está em acordo com historiadores e filósofos mais recentes que interpretam relações de "idas e vindas" entre o real e o racional.


Dessa forma, Leonardo defende a potencialidade de ficções criarem circunstâncias reais a partir do conceito de performatividade de John Austin (1962), para o qual a dimensão performativa se relaciona com a capacidade de “fazer coisas e Judith Butler (1993) para a qual a performance reitera discursos e práticas. Assume também as acepções de performance de Robert Crease e Andrew Pickering para falar da "dança das agências humanas e não humanas que, quando sintonizadas, criam ficções que tem o potencial de estabelecer uma nova realidade científica. Utilizando a performance como um conceito necessário para analisar a relação entre ficção e realidade, Leonardo chama atenção de que não é toda e qualquer ficção que pode se tornar verdade científica: para tal é exigido um disciplinamento demandado pelos métodos que uma atividade teórica adota e utiliza e que pode resistir. Desse modo, assume que verdades são simultaneamente: reais, objetivas, relativas e históricas.


O autor analisa, então, o que chamou de ficção social, analisando o cenário dos movimentos de ocupação estudantil das escolas nos anos de 2015 e 2016. Leonardo propõe que os movimentos de ocupação produziram uma ficção utópica feita de acontecimentos reais. Destaca a ironia da situação: a Escola – possuidora de relativa autonomia com relação ao mundo real do trabalho, portanto espaço privilegiado onde os laboratórios utópicos são possíveis – tem nos movimentos o reconhecimento dos estudantes como um espaço para ser defendido ou ser transformado em um espaço que a pena a luta. Assim, destacando a importância das discussões, que foi alcançada através dos movimentos de ocupação, Leonardo chama atenção para o caráter de formação constante que o mundo ético assume.


Para concluir, o autor retoma a compreensão de ficção pela via negativa (aquela entendida como oposição da realidade, mentira, falsidade) para construir uma reflexão sobre a distinção entre essas possibilidades de ficções. É possível para ele a distinção entre FICÇÕES, entretanto destaca que elas possuem diferentes níveis de complexidade. Isso demanda o desenvolvimento da capacidade de perceber, analisa e compreender suas estruturas. Assim, ao assumir o ensino de física como cultura, que traz o conhecimento científico para o seu “contexto histórico, social, cultural, econômico e tecnológico em que são criadas e no qual fazem sentido” contribui para o desenvolvimento da capacidade crítica necessária para distinguir diferentes ficções.

Enfim, ótima leitura!


Escrito por Brenda Costa


CROCHIK, Leonardo. A ficção criadora do real. In: Física, Cultura & Ensino de Ciências. André Ferrer P. Martins (org). Editora Livraria da Física. 1°ed. 2019.


 
 
 

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